quarta-feira, 5 de novembro de 2008

CAPITU


De um lado vem você com seu jeitinho
Hábil hábil, hábil.. e pronto!
Me conquista com seu dom
De outro esse seu site petulante
WWW ponto poderosa ponto com

É esse o seu modo de ser ambiguo
Sábio, sábio
E todo encanto, canto, canto
Raposa e sereia da terra e do mar
Na tela e no ar
Você é virtualmente amada amante
Você real é ainda mais tocante
Não há quem não se encante

Um método de agir que é tão astuto
Com jeitinho alcança tudo, tudo, tudo
É só se entregar, é só te seguir, é capitular

Capitu
A ressaca dos mares
A sereia do sul
Captando os olhares
Nosso totem tabu
A mulher em milhares
Capitu

De um lado vem você com seu jeitinho
Hábil hábil, hábil.. e pronto!
Me conquista com seu dom
De outro esse seu site petulante
WWW ponto poderosa ponto com

É esse o seu modo de ser ambiguo
Sábio, sábio
E todo encanto, canto, canto
Raposa e sereia da terra e do mar
Na tela e no ar
Você é virtualmente amada amante
Você real é ainda mais tocante
Não há quem não se encante

No site o seu poder provoca o ócio, o ócio
Um passo para o vício, o vício, o vício
É só navegar, é só te seguir, e então naufragar

Capitu
A ressaca dos mares
A sereia do sul
Captando os olhares
Nosso totem tabu
A mulher em milhares
Capitu

De um lado você vem com seu jeitinho
Hábil, hábil, hábil... e pronto!
Me conquista com seu dom
De outro esse seu site petulante
WWW ponto poderosa ponto com

É esse o seu modo de ser ambíguo
Sábio, sábio
E todo encanto, canto, canto
Raposa e sereia da terra e do mar
Na tela e no ar
Você é virtualmente amada amante
Você real é ainda mais tocante
Não há quem não se encante

No site o seu poder provoca o ócio, o ócio
Um passo para o vício, o vício, o vício
É só navegar, é só te seguir, e então naufragar

Capitu
A ressaca dos mares
A sereia do sul
Captando os olhares
Nosso totem tabu
A mulher em milhares

Capitu
Feminino com arte
A traição atraente
Um capitulo a parte
Quase vírus ardente
Imperando no site
Capitu

Capitu
A ressaca dos mares
A sereia do sul
Captando os olhares
Nosso totem tabu
A mulher em milhares
Capitu


Composição: Luiz Tatit
Entrevista e interpretação da música com Zélia Duncan


Características da personalidade de Capitu

“— Se eu fosse rica, você fugia, metia-se no paquete e ia para a Europa.
(...)
Como vês, Capitu aos quatorze anos , tinha já idéias atrevidas, muito menos que outras que lhe vieram depois; mas eram só atrevidas em si, na prática faziam-se hábeis, sinuosas, surdas, e alcançavam o fim proposto, não de salto, mas aos saltinhos. Não sei se me explico bem. Suponde uma concepção grande executada por meios pequenos.” (pg 47)

“Capitu era Capitu, isto é, uma criatura mui particular, mais mulher do que eu era homem.” (pg 68)

“Era também mais curiosa. As curiosidades de Capitu dão para um capítulo. Eram de várias espécies, explicáveis e inexplicáveis, assim úteis como inúteis, umas graves, outras frívolas; gostava de saber tudo.” (pg 68)

“(...) prima Justina reteve-me alguns minutos, falando do calor e da próxima festa da Conceição, dos meus velhos oratórios, e finalmente de Capitu. Não disse mal dela; ao contrário insinuou-me que podia vir a ser uma moça muito bonita. Eu, que já a achava lindíssima, bradaria que era a mais bela criatura do mundo, se o receio não me fizesse discreto. Entretanto, como prima Justina se metesse a elogiar-lhe os modos, a gravidade, os costumes, o trabalhar para os seus, o amor que tinha a minha mãe, tudo isto me acendeu a ponto de elogiá-la também. Quando não era com palavras, era com o gesto de aprovação que dava a cada uma das asserções da outra, e certamente com a felicidade que devia iluminar-me a cara. (...) É certo que, após algum tempo, modificou os elogios a Capitu, e até lhe fez algumas críticas, disse-me que era um pouco trêfega e olhava por baixo (...)” (pg 54)

“Estava tão contente com aquela grande dissimulação de Capitu que (...) corri a referir-lhe a conversa e louvar-lhe a astúcia.” (pg 130)

“Capitu era naturalmente o anjo da Escritura. A verdade é que minha mãe não podia tê-la agora longe de si. A afeição crescente era manifestada por atos extraordinários. Capitu passou a ser a flor da casa, o sol das manhãs, o frescor das tardes, a lua das noites; lá vivia horas e horas, ouvindo, falando e cantando.” (pg 152)

“Capitu gostava de rir e divertir-se e, nos primeiros tempos, quando íamos a passeios ou espetáculos, era como um pássaro que saísse da gaiola. Arranjava-se com graça e modéstia. Embora gostasse de jóias, como as outras moças, não queria que eu lhe comprasse muitas, nem caras, e um daí afligiu-se tanto que prometi não comprar mais nenhuma; mas foi só por pouco tempo.” (pg 188)

“Não sabendo piano, aprendeu depois de casada, e depressa, e daí a pouco tocava nas casas de amizade. Na Glória era uma das nossas recreações; também cantava, mas pouco e raro, por não ter voz; um dia chegou a entender que era melhor não cantar nada e cumpriu o alvitre. De dançar gostava, e enfeitava-se com amor quando ia a um baile; (...)” (pg 188)

“Já disse que era poupada, ou fica dito agora, e não só de dinheiro mas também de coisas usadas, dessas que se guardam por tradição, por lembrança ou por saudade. (pg 189)

“O resto é saber se a Capitu da praia da Glória já estava dentro da de Matacavalos, ou se esta foi mudada naquela por efeito de algum caso incidente. (...) se te lembras bem da Capitu menina, hás de reconhecer que uma estava dentro da outra, como a fruta dentro da casca.” (pg 250)



ASSIS, Joaquim Maria Machado de. Dom Casmurro. Click Editora (especialmente para o Jornal O Globo), edição de 1997 (edição original em 1899).

Seleção feita pela estagiária Raquel Ferreira.

Características físicas de Capitu

“Não podia tirar os olhos daquela criatura de quatorze anos, alta forte e cheia, apertada em um vestido de chita, meio desbotado. Os cabelos grossos, feitos em duas tranças, com as pontas atadas uma à outra, à moda do tempo, desciam-lhe pelas costas. Morena, olhos claros e grandes, nariz reto e comprido, tinha a boca fina e o queixo largo. As mãos, a despeito de alguns ofícios rudes, eram curadas com amor; não cheiravam a sabões finos nem águas de toucador, mas com água do poço e sabão comum trazia-as limpas e sem mácula. Calçava sapatos de duraque, rasos e velhos, a que ela mesma dera alguns pontos.” (pg 36)

“(...) ela era um nadinha mais alta que eu (...)” (pg 72)

“Continuei a alisar os cabelos, com muito cuidado, (...) mas devagar, devagarinho, saboreando pelo tato aqueles fios grossos, que eram parte dela.(...) Não pedi ao céu que fossem tão longos como os de Aurora, porque não conhecia ainda esta divindade que os velhos poetas me apresentaram depois; mas desejei penteá-los por todos os séculos dos séculos, tecer duas tranças por um número inominável de vezes. Se isto vos parecer enfático, desgraçado leitor, é que nunca penteastes uma pequena, nunca pusestes as mãos adolescentes na jovem cabeça de uma ninfa... Uma ninfa!” (pg 73)

“Capitu, apesar daqueles olhos que o diabo lhe deu... Você reparou nos olhos dela? São assim, de cigana oblíqua e dissimulada.”(Fala de José Dias à Bentinho, pg 57)

“— Juro! Deixe ver os olhos, Capitu.
Tinha-me lembrado a definição que José Dias dera deles, ‘olhos de cigana oblíqua e dissimulada’. Eu não sabia o que era oblíqua, mas dissimulada sabia, e queria ver se se podiam chamar assim. Capitu deixou-se fitar e examinar. Só me perguntava o que era, se nunca os vira; eu nada achei de extraordinário; a cor e a doçura eram minhas conhecidas. A demora da contemplação creio que lhe deu outra idéia do meu intento; imaginou que era um pretexto para mirá-los mais de perto, com meus olhos longos, constantes, enfiados neles, e a isto atribuo que entrassem a ficar crescidos, crescidos e sombrios, com tal expressão que...
Retórica dos namorados, dá-me uma comparação exata e poética para dizer o que foram aqueles olhos de Capitu. Não me acode imagem capaz de dizer, sem quebra da dignidade do estilo, o que eles foram e fizeram. Olhos de ressaca? Vá de ressaca. É o que me dá idéia daquela feição nova. Traziam não sei que fluído misterioso e energético, uma força que arrastava para dentro, como a vaga que se retira da praia, nos dias de ressaca. Para não ser arrastado, agarrei-me às outras partes vizinhas, às orelhas, aos braços, aos cabelos espalhados pelos ombros; mas tão depressa buscava as pupilas, a onda que saía delas vinha crescendo, cava e escura, ameaçando envolver-me, puxar-me tragar-me. Quantos minutos gastamos naquele jogo? Só os relógios do céu terão marcado esse tempo infinito e breve.” (pg 71)

“Momento houve em que os olhos de Capitu fitaram o defunto, quais os da viúva, sem o pranto nem as palavras desta, mas grandes e abertos, como a vaga do mar lá fora, como se quisesse tragar também o nadador da manhã. (pg 217)

“(...)os braços é que... Os braços merecem um período.
Eram belos, e na primeira noite que os levou nus a um baile, não creio que houvesse iguais na cidade, nem os seus, leitora, que eram então de menina, se eram nascidos, mas provavelmente estariam ainda no mármore, donde vieram, ou nas mãos do divino escultor. Eram os mais belos da noite, a ponto de me encherem de desvanecimento. (pg 188)


ASSIS, Joaquim Maria Machado de. Dom Casmurro. Click Editora (especialmente para o Jornal O Globo), edição de 1997 (edição original em 1899).



Seleção feita pela estária Raquel Ferreira

Uma nação Capitu

Os olhos de ressaca, de cigana oblíqua e dissimulada da personagem de Machado de Assis são um patrimônio feminino brasileiro

Como seria interpretar, sobre um palco, a personagem Capitu, com seus olhos de cigana oblíqua e dissimulada? É impossível, para uma atriz, dar conta totalmente da complexidade desse olhar tão poderosamente descrito por Machado de Assis em Dom Casmurro. Cada um de nós teria, certamente, o seu toque oblíquo, as suas olheiras de ressaca, a sua dissimulação, o seu fluido misterioso e energético. A minha intuição me faria interpretar Capitu com a absoluta crença de que esse olhar está, todo ele, subdividido no olhar da brasileira. Todas nós somos Capitu. Esse olhar nos pertence. E só a nós. É um patrimônio do feminino brasileiro.

Machado nos ensinou a vê-lo e o equacionou. Esse olhar é a nossa miscigenação, a nossa aparente submissão, são as nossas olheiras amorosamente gulosas, quentes e erotizadas. É o olhar que denuncia a marginal vitória desse ser-mulher colonizado. Olhar de quem dissimuladamente aceita o jogo surdo, silencioso, de carrasco e vítima, jogo fascinante e cruel na aparente aceitação das diversas manifestações do relacionamento humano. Essa luta dolorosa fascina Dom Casmurro porque ela é jogada no campo da dúvida.

Ao descrever Capitu, Machado esclarece: "Retórica dos namorados, dá-me uma comparação exata e poética para dizer o que foram aqueles olhos de Capitu. Não me acode imagem capaz de dizer, sem quebra da dignidade do estilo, o que eles foram e me fizeram. Olhos de ressaca? Vá, de ressaca?" Nessas circunstâncias, o autor lança mão da imagem da cigana (presença marginal), do olhar de ressaca (visão de uma carne indomável) e do olhar oblíquo (não definido, não confiável, dissimulado).

Os olhos mostram o que desejamos ver por meio deles. É sempre também o reflexo, a projeção de quem olha. Esse perscrutar de olhares se apresenta desde o primeiro momento em que os hormônios começam a latejar. Não é só o menino que é o pai do homem. A menina também é a mãe da mulher. Os heróis de Dom Casmurro se conheceram na adolescência. Com mais luz ou menos luz, os olhos de uma menina de 14 anos já denunciam o olhar de toda uma vida.

Dom Casmurro é um tratado sobre o olhar. Capitu é emblemática. Bentinho descreve seu próprio olhar, olhando Capitu. Ouso falar sobre Capitu como atriz. Como se estivesse analisando um texto de dramaturgia, juntamente com um elenco, ao redor de uma mesa. Não estou aqui me arvorando em crítica literária. E como mulher de palco digo que, se eu tivesse tido na minha vida a oportunidade de tentar interpretar Capitu, partiria do ponto de vista de sua clara, profunda e inconfundível brasilidade.

Não estou circunscrevendo Capitu a nossa aldeia. Ela é universal como literatura e como perfil de mulher. Indo além do que já ousei e me arrisquei nestes parágrafos, intuo que, embora o Brasil seja nome masculino, nosso país, por nossa complexidade oblíqua, energética, misteriosa, pela nossa História contada sempre de uma forma tão dissimulada e pelo fascínio tão decantado de nossos trópicos, é, no fundo, uma nação Capitu.



Por Fernanda Montenegro

Artigo publicado na revista Época 500 anos, edição especial, em 17 de abril de 2000.

Crônica

1 HIST. Compilação de fatos históricos apresentados segundo a ordem de sucessão no tempo (Originalmente a crônica limitava-se a relatos verídicos e nobres; entretanto, grandes escritores a partir do s.XIX passam a cultivá-la, refletindo, com astúcia e oportunismo, a vida social, a política, os costumes, o cotidiano etc. do seu tempo em livros, jornais e folhetins.)

4 p. ext. JOR. Coluna de periódicos, assinada, com notícias, comentários, algumas vezes críticos e polêmicos, em torno de atividades culturais (literatura, teatro cinema etc.), de política, economia, divulgação cientifica, desportos etc., atualmente tb. abrangendo um noticiário social e mundano. Cf. coluna.
4.1 Conjunto de matérias e estilo próprios de uma atividade ou tema (a C. literária) (a C. policial) (a C. esportiva) (a C. política).

5 M. COM. Noticiário a respeito de fatos atuais (para uma grande maioria, somente a televisão faz a crônica diária).
5.1 p. ext. Descrição dos principais acontecimentos de uma dada situação (o ataque terrorista resultou numa c. de tragédias).

6 LIT. Texto literário breve, em geral narrativo, de tema quase sempre pouco definido e motivos, na maior parte, extraídos do cotidiano imediato.

7 p. ext. LIT. Prosa ficcional, relato com personagens e circunstancias alentadas, evoluindo com o tempo; romance ( leu com enlevo a Crônica da casa assassinada).

8 p. ext. infrm. História ou conjunto de boatos, rumores, notícias a respeito de algo ou alguém em determinada região ou lugar (era cada vez pior a c. que nos chegava sobre o candidato).




HOUAISS, Antônio e VILLAR, Mauro Salles. Dicionário Houaiss da Língua Portuguesa. Rio de Janeiro: Objetiva, 2001, p.877